DISFARCE

DISFARCE


De face com a realidade mas sem ouvir o grito que a vida dá. É o disfarce ao pé da cama, um oratório e uma meia velha. Joelhos dobrados e a colcha rasgada não esquenta mais ninguém.
Acontece que as horas se sobrepõem e se encontram quando a noite chega. Sol e lua no quadro da parede e no céu que avisto pelo vão da janela quebrada. Disfarce e não sobra nada pra sentir o sabor.
Um cheiro no ar: perfume de carne assada.
A flor murcha no vaso da cômoda e ainda o grito da vida não chega aos ouvidos. A panela queima no fogo e não abro mão dos chinelos gastos. Pensamentos disfarçados. Sombras.
A face. Puro disfarce.
Pés descalços, a pele e a cor.
A brasa é o meu sangue. O fervilhar gota a gota escorre da femoral e a poça aparece num verdadeiro embuste que mete medo.
Que nada! Disfarce. O pensamento disfarça e os olhos veem o que querem.
O sangue é de mentira. Os joelhos já marcados ainda dobrados no chão de tábua, arranca uma farpa da madeira antiga que reveste o piso do quarto.
Ah! A vela já está pra apagar e a oração desdenhosa e cheia de inverdades em piedade, chama o nome de um santo protetor.
A carne assada está servida. O prato quase escorrega das mãos porque a gordura quente lambuzou a borda toda.
O sol e a lua brigam pelo espaço no quadro e também no céu.
Hora do jantar.
Pensamentos disfarçados não arriscam encaminhar nenhuma palavra pra essa boca que brilha pela gordura da carne. Tem um cheiro forte do tempero que deu sabor a essa mesma carne gorda. Gorda.
Disfarce. (Amém).

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