anjos não caíram do céu

a trovoada chegou cedo 
e o mundo resolveu desabar
alagou além dos quintais
as ruas todas (tolas) da cidade

caiu granizo, raio
canivete, cinza molhada
árvore, muro, até avião
: transbordou o rio solitário

do céu despencou desventura
e mil sonhos naufragaram 
vidas (quase inteiras) se perderam
e a lama mudou o asfalto de cor

o ônibus, feito barco, flutuou
a piscina suja não convidou ao nado, mas
sua borda transtornou a população
veio onda forte levando carros na contramão

apenas anjos não caíram do céu
tudo ficou turvo e conturbado
as asas se perderam lá em cima
não voaram (nem nadaram) os querubins

restou desassossego e antitetânica
o piso da casa soltou-se todo
boiaram as ilusões no presente
de um passado já conhecido

promessas chegam em todo pleito
e a dor que começa no peito
adormece o corpo que sem força
luta pra limpar a alma, o corpo e o chão

anjos não caíram do céu
e novos lampejos gritam estridentes do alto
meu coração de um salto
se ajoelha, pede calma ao Tlatoc, velho deus

senhor do raio e do trovão
não avance mais uma vez
dê-se trégua aos desatentos
sem tirania:
    repouse o vento 
    adormeça às águas 
    sorria aos céus
    descanse novo tormento
    perdoe os desalentos
    faça, à noite, o sol
    vida viva (s)em tempo.



Homem caminha em rua alagada numa das enchentes em 2016

Fonte: https://taboaoemfoco.com.br/opiniao-tres-medidas-para-diminuir-os-prejuizos-com-as-enchentes-em-taboao-da-serra/


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